22 de setembro de 2007

É Tempo / Não Faz Assim

É uma vida, é um tempo, um tempo indeterminado que eu não sei contar. É uma força, um fato, um carro, um pasto. Passa. Eu falo da vida, da morte, de Maria e Alfredo. Falo das casas, das cascas, dos escritores, da escrita e de mim. Falo das coisas como são, como deveriam ser e como nunca serão. Falo de como não sei dizer o que gostaria.
Não falo das coisas pra mim ou por mim: sou as coisas.
Num círculo de fogo vicioso eu vivo sem saber se vivo ou finjo. Falo, faço, canto, respiro e parto.
Vomito de bile, pasto seco, mundo curto, gente curta.

“É tempo de partido
É tempo de homens partidos”

Falo e me calo. Como recorte de jornal: sou. Re-fabrico e re-edito o dantes dito. Sou reprise repetida dos meus eus oblíquos. Me fito de lado, tiro foto, vejo o perfil. Saio: a boemia não é tão amiga. Eu gosto é de gente pouca, fala baixo que criança dorme dois continentes depois. Falta água lá, sobra aqui: falsa ilusão.
Escrevo o dantes lido. Não sou escritora de fato, só reproduzo o meio. Reproduzo minha síntese. Sou, estou e escrevo o meu meio, todas essas minhas horas e minutos.

“Meu partido,
É um coração partido”

Falta saliva para gritar
Falta oxigênio para sintetizar
Inspiro
Unnnnnn
Expiro
Uuuuuuu:
Fico com dor de cabeça
O mundo gira
As vacas são mudas
O dia é curto
E ninguém liga

Passo, repasso, revejo o tempo e perco mais: não crio mais nada. Nada se cria. Original em mim só a cópia. A cópia que ninguém leu os originais. Me asfixie, me fure, me machuque. Me pegue forte, me arraste, me chupa, me mata. Diz que me odeia e que me mata se eu piscar.

-Sussurra, fala baixo
-Quero gritar mulher, você não presta. Merece mesmo é morrer!
-As criança dorme, não grita. Me bate, me mata, mas não grita
-Eu grito porque você é uma vaca
-Não grita que só eu preciso ouvir, as criança não
-Cala a boca muié! Agora você vai aprender a me respeitar!

O mundo não quer ser concertado, mas eu não quero que se desconserte mais. Não mente que é feio. Não mente. Não me diga mais verdades porque dói. Não morre que machuca. Não transa que mata. Não xinga que é falta de educação. Fica mudo mulato burro. Fica mudo mulher feia e pobre. Fica muda loira gostosa. Fica mudo, criado mudo, muda a muda. Não mundo, não muda.
Abafa o bafo seco de álcool do mundo. O mundo quer álcool, agora todo mundo quer. Me dá mais, me dá mais, me sacia. Me dopa, me joga: quero mais álcool.

O mundo quer álcool
Todo mundo quer álcool

O tempo é de nada. Pasmes. É tempo de piada maldosa e fútil, tempo de contar moedas vergonhosas. Tempo de mísseis, terror, terror, terror. Contei pra você que mais um país foi invadido você nem ligou. Contei das flores mortas que nasceram, ninguém leu. Pó de todo o tipo: pó cinza, pó branco, pó preto, menos pó marrom, esse não é visto. É tempo de rir do outro e não cuidar de ti. É tempo de se cortar e dizer que foi o outro. Não faz assim homem, não faz assim ser humano, não faz assim. Te ajuda e não reza. Se cala e não reza. Não chora por machucado de moto, chora por teus irmãos. Não faz assim mulher, não faz assim ser humano: não segrega, não dissipa, não faz assim. Não mata seu próximo como forma de matar você: inconsciente. Não faz assim, não seja assim: vá além, seja Deus.