12 de fevereiro de 2007

Uuuu...

>>Escuta: Diana Krall - várias músicas de Ray Charles interpretadas por ela
>>Pensa: Odeio espinhas
>>Sente: Espinhas?
>>Sonho do dia: Não ter espinhas nunca mais!


Cry, Cry, Cry

Com cautela, olha fragilizada o céu. Quando criança sua inocência era de mulher. E agora que já é quase uma, sua inocência é de criança que ainda mama e é dependente. E ela tenta crer no futuro, mas ele ainda não se fez. Logo, tenta se manter no presente, que insiste em fugir. E como tijolinhos cruzados e com desenhos detalhados seus segundos vão sendo traçados. Nada apareceu de novo. Nada se criou. Nada descobriu. E ela foi se descobrindo com o vento que vinha. Nada era voluntário. Agora já tinha um pouco mais de toque nos dedos e unhas feitas. Mas ainda era com ansiedade que esperava a vida se tornar vida. Ainda era com desprezo que contava seu nome. Como já nada mais esperava tudo se tornava diferentemente do antes. Era feito música enlaçada que ela olhava, e disfarçava: como pianista inventor.
Tocava em cada objeto como instrumento novo: como se a cada toque saísse uma nota nunca antes ouvida. E assim ela se fazia sozinha. Como em uma melodia sem fim e contínua, sua anti-vida seguia.
Debruçou-se na janela. Viu a nuvem negra e carregada aproximar-se do Sol radiante. E viu que em um instante tudo poderia mudar: o vento era forte. Havia pedaçinhos do céu livres onde só se via o azul do bebê que nunca teria. Então era ela: nua na janela e sem nada para prever. Sem previsões de tempo bom ou ruim. De suas mãos saiu um leve suor que fez deslizar um pouco: logo o vento secou e lhe arrancou mais um pedaço que lhe cobria. Sentiu o cheiro do cachorro que nunca vira, mas que sabia que existia na casa ao lado. O imaginou: tamanho médio, fora de forma, cansado, pêlos grossos e lisos e embaraçados; sujo, muito sujo.
Logo após ter feito o retrato do cão em mente pensou em como gostava de errar e de como não gostava de quando não a deixavam errar. E principalmente se fizessem de forma brusca. – Oras como iria se descobrir assim? Logo, era só ela, seus pensamentos desconexos, vento, nuvens negras, sol radiante e um cachorro sujo. Essa era a paisagem de seu presente. E como construir a paisagem do seu futuro sem elementos? Ela até poderia criar em mente mil sensações: todas passageiras. Não era do que precisava ou gostaria. Precisava de visões concretas. Não poderia viver seu futuro, por mais que o imaginasse, não iria vivê-lo. Tudo se fez real no mento dessa breve percepção. Mas logo a sensação de sossego passou: outra pergunta lhe veio – Quando iniciaria o futuro? Oras, já era pensar de mais. Já eram graves essas questões medíocres. Cansara-se de mais naqueles instantes inertes. Apenas amoleceu o corpo que foi caindo suavemente sobre a cama. E lá, adormeceu, sem que notasse que o futuro se fazia presente.

Um comentário:

Rafael Magalhães disse...

"cry me a river" é uma das músicas mais CAFONAS que eu já ouvi, haha!